Administração de bens. O poder dos pais em relação à administração dos bens dos filhos menores não é absoluto. Em caráter excepcional, é possível o ajuizamento de ação de prestação de contas pelo filho. Isso quando o pedido for fundamentado na suspeita de abuso de direito por parte dos pais. Esse entendimento foi manifestado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O STJ julgou o recurso que teve origem no pedido de um filho para que sua mãe adotiva prestasse contas do período em que administrou a pensão por morte. Benefício recebido desde o falecimento de seu pai até o atingimento da maioridade.
Leia também:
Plano de saúde coletivo – beneficiário pode questionar rescisão
Segundo o filho, mesmo o benefício tendo sido depositado em conta corrente durante cinco anos, a mãe o deixou abandonado. E ele não recebeu nenhum valor para custear alimentação, vestuário e outras necessidades. Fato que configuraria abuso de direito.
O juízo de primeiro grau extinguiu o processo sem resolução de mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, já que entendeu não ser possível pedir prestação de contas a quem não tem o dever de prestá-las. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, porém, cassou a sentença para determinar o regular processamento do feito.
De acordo com o relator do recurso no STJ, o pai e a mãe, “enquanto no exercício do poder familiar, são usufrutuários dos bens dos filhos (usufruto legal), bem como têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade”, nos termos do artigo 1.689, incisos I e II, do Código Civil.
“Por esse motivo, em regra, não existe o dever de prestar contas acerca dos valores recebidos pelos pais em nome do menor, durante o exercício do poder familiar, porquanto há presunção de que as verbas recebidas tenham sido utilizadas para a manutenção da comunidade familiar, abrangendo o custeio de alimentação, saúde, vestuário, educação e lazer, entre outros”, afirmou o relator.
Entretanto, ele esclareceu que o fato de os pais serem usufrutuários e administradores dos bens dos filhos menores “não lhes confere liberdade total para utilizar, como quiserem, o patrimônio de seus filhos, o qual, a rigor, não lhes pertence”.
Decisão de prestação de contas – administração de bens
Como o poder dos pais não é absoluto, ressaltou o relator, “deve-se permitir, em caráter excepcional, o ajuizamento de ação de prestação de contas pelo filho, sempre que a causa de pedir estiver fundada na suspeita de abuso de direito no exercício desse poder”, pois “inviabilizar, de plano, o ajuizamento de ação de prestação de contas nesse tipo de situação acabaria por cercear o direito do filho de questionar judicialmente eventual abuso de direito de seus pais”.
O relator explicou que a ação de prestação de contas possui duas fases: na primeira, o autor busca a condenação do réu à obrigação de prestar contas; na segunda, serão julgadas as contas apresentadas.
Segundo o relator, caberá ao filho comprovar, na primeira fase, o abuso do direito, demonstrando que a mãe deixou de lhe repassar o mínimo necessário para garantir o atendimento de suas necessidades. Havendo a comprovação, o juiz julgará procedente a demanda a fim de obrigar a mãe a prestar contas dos valores recebidos. Caso o filho não comprove o abuso de direito, deverá a ação ser julgada improcedente, afastando-se a obrigação de prestar contas.